Quando eu era criança, pensava que
quando trovejava era porque o Papai-do-céu estava brabo, talvez por alguma
travessura minha... Meu pai me dizia que não era por isso, que na verdade era
um fenômeno físico, ou alguma coisa assim. Mas eu preferia pensar que o
Papai-do-céu estava brabo comigo, e eu ficava horas pensando, tentando
descobrir o que tinha feito de errado, pra poder pedir perdão e parar de
trovejar...
Quando eu era criança, gostava de pular
as sombras das árvores no asfalto quando eu saia de carro com meu pai. Iam as
rodas da frente primeiro, pulavam, e depois, quando essas tocavam no chão, as
detrás é que pulavam, fugindo das sombras, pulando de luz em luz. Passava a
viagem inteira fugindo das sombras, buscando a luz, sem contar nada pra
ninguém...
Quando eu era criança, gostava de mirar
com os olhos nos bandos de passarinhos que voavam da beira da estrada quando o
carro passava. Mirava e atirava em um por um, não errava um tiro. Eles não
caíam, não morriam... Era só de brincadeira. E apenas eu sabia como atirava bem
com meus olhos...
Quando eu era criança, pensava que o
mundo era em preto-e-branco antes de ser colorido, assim como as fotografias e
os filmes antigos. E era lindo ver os vários tons e matizes cinzas, a
profundidade das sombras e das paisagens. Certo dia, Papai-do-céu teve a
divertida ideia de colorir as coisas. Deve ter começado com o pôr-do-sol e
depois com o amanhecer; depois derramou verde sobre os campos e azul sobre as
águas e o céu. Então, aos poucos, foi colorindo as frutas, as flores, os
animais, as gentes... Só depois coloriu as fotos e a televisão...
Mas isso tudo é coisa de criança. Em
verdade, não há encanto algum numa tempestade nem ninguém nos vigiando do cimo
das nuvens, não é possível desviar das sombras do caminho e caminhar somente
pela luz, nossos olhos não têm poder, e as coisas sempre foram coloridas como
hoje são.
Espere... Você não está escutando? Eu
estou escutando uma voz, de criança, que vem de dentro de mim, e ela me diz,
Não, você está errado, não perca o encanto da vida, não deixe de buscar sempre
a luz, não deixe de olhar as coisas com os olhos da alma, nem aos pássaros, nem
às pessoas, nem às cores.
Existe uma criança dentro de cada um de
nós. Não deixe que a aspereza e sujeira do mundo a macule e a sufoque. Ver o
mundo com encanto, fantasia, esperança e amor, isto é coisa de criança.
(Danilo Kuhn)
Minha Crônica Afônica "Coisa de criança" foi publicada no Jornal TRADIÇÃO REGIONAL, à página 7, na edição de 12 a 18 de outubro de 2012, com direito à minha fotinho quando criança...
ResponderExcluirMuito obrigado ao Jornal e seus responsáveis, e à Claudia Duarte pela força de sempre.
http://blogdascronicasafonicas.blogspot.com.br/2012/10/coisa-de-crianca.html
"Existe uma criança dentro de cada um de nós. Não deixe que a aspereza e sujeira do mundo a macule e a sufoque. Ver o mundo com encanto, fantasia, esperança e amor, isto é coisa de criança".