segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Café-passado


Demorei muito para dormir, mas agora consegui e de repente me vi aqui, guardando o seu sono. Você não me vê, mas me sente quando acaricio o seu rosto nessas visitas noturnas que lhe faço enquanto durmo.
Minhas mãos luzidias deixam transparecer sua pele enquanto lhe toco a alva face envolta em brumas róseas e celestes do alvorecer que já não tarda. Lágrimas alaranjadas de luz do sol descaem das frestas da janela prenunciando o dia que nasce e o amor que se põe ao passo que começo a despertar, a abandonar seu leito onde lhe velava o sono.
Aos poucos minha alma retorna ao corpo, entorpecido de sua ausência. Enquanto desperto, ainda posso sentir o calor do seu rosto nos meus dedos e o torpor do seu perfume dançando a me enlevar. Mas à medida que a consciência vai recobrando de si, fica mais difícil desvelar o emaranhado de sensações impregnadas à essência do espírito, deixando-se apenas adivinhar pelo brilho do olhar, ainda um pouco embaçado de sono.
Xícaras de café, água no rosto, claridade, ardis que a alma finge aceitar como verossímeis para devolver ao corpo os reflexos e os sentidos necessários ao dia. No entanto, nos recônditos, o pano-de-fundo dos pensamentos me sussurra o seu nome em meio à névoa do cotidiano.
As imagens que a alma contempla em sonhos ela guarda em nós de forma insondável, mas inegável. Não percebemos que nosso inconsciente é nossa alma, consciente, a nos guiar, sob o codinome do acaso. Temos um inconsciente vivo dentro de nós. Escuta?!

(Danilo Kuhn)


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