segunda-feira, 2 de abril de 2012

Briga de torcidas


A Luiza e o André se conheceram há pouco tempo, paixão dessas que não se resiste nem se reflete: se mergulha. Atração fatal, lance de energia, química do amor. Namoro novo que se reconhece de longe: não se desgrudam nunca, beijos e carinhos em público, são só sorrisos. Parecem dois adolescentes, apesar dos vinte e tantos. O amor nos rejuvenesce...
O novo casal realmente tem muita coisa em comum. A Luiza é estudante de Arquitetura, o André faz faculdade de Engenharia Civil. A Luiza gosta de comida italiana, o André adora pizza e macarronada. A Luiza curte caminhar pelos parques da cidade, o André preza muito o contato com a natureza. A Luiza ama as crônicas da Martha Medeiros, o André acha o Veríssimo um cara muito inteligente. A Luiza é fã da Legião Urbana, o André toca Pais e filhos e Eduardo e Mônica no violão. E as semelhanças entre os dois enamorados por aí vão, interligando cada vez mais o casal a cada descoberta de gosto em comum.
Mas nem só as semelhanças são benéficas ao amor. A Luiza gosta de vinho suave, o André de vinho seco. Quando foram jantar juntos pela primeira vez, o André decidiu pedir vinho suave para agradar a moça. O amor também é feito de trocas, de renúncia... A Luiza também já cedeu: quando o André queria ir ao show do Pouca Vogal, ela o acompanhou e deixou de ir à festa de aniversário da melhor amiga. Todos têm que ceder. Ao menos um pouquinho.
Só que neste fim de semana teve clássico Grenal, e a Luiza é gremista e o André colorado. Ambos fanáticos. Daí não teve jeito, nenhum dos dois deu o braço a torcer. Permaneceram ela gremista, ele colorado. Foi o primeiro Grenal do casal, e foi tudo bem. Cada um vibrou com seu time, torceu, secou, gritou gol, cada um na sua, e o jogo acabou um a um. Depois do jogo, abraços, discussão construtiva sobre o jogo, jantarzinho íntimo e... Um a um no amor.
Se não houvesse respeito entre o casal, talvez ficassem no zero a zero. Eles souberam aprender a respeitar um ao outro, um ao time do outro. Nenhum deles diminuiu sua paixão pelo seu time do coração, e nem comprometeu a sua paixão um pelo outro. Noutros tempos, a Luiza xingaria os colorados. O André então, nem se fala. Já foi a clássicos e arranjou briga. Mas hoje em dia entendem que sua paixão não anula a do outro. Cada um de nós tem suas preferências, e preferir um clube de futebol a outro não nos torna melhores ou piores que ninguém. Parece um tanto óbvio, mas tem muita gente que confunde amor ao seu time com ódio ao rival.
Obviamente há a flauta, aquela brincadeira, a provocação ao torcedor adversário, muitas vezes sadia. A rivalidade ajuda aos clubes a se esforçarem sempre ao máximo para superar o rival. Mas quando isso descamba para a agressividade, para a violência, tudo muda de figura.
Nos estádios, nos bares e nas ruas, além de famílias, além de pessoas de bem, sempre há aquelas pessoas prontas para a briga, com a intenção da bagunça, com o espírito da baderna. Mais parecem romanos ao Coliseu. A verdadeira razão de estarem ali é a violência, é a anarquia, e não a paixão futebolística. O futebol é apenas o bode-expiatório.
O André e a Luiza já combinaram: de vez em quando, um vai acompanhar o outro nos jogos do Grêmio, e do Inter. Não vão chegar ao ponto de vestir a camisa do rival, vão à paisana. Mas que mal há nisso? Em acompanhar o grande amor no jogo do seu time?
Briga de torcidas não combina com o amor. Nem com o amor homem/mulher nem com o amor ao próximo. Tu escolhes teus amigos pela cor da camisa? Tu eleges teus relacionamentos de acordo com o clube do coração? Só compras roupas da cor do teu time? Não aceitarias um bom negócio porque o carro é da cor do rival? Convenhamos. Não sejamos tão pequenos.
No jogo da vida, ou no do amor, não há espaço para briga de torcidas. Agita tua bandeira, veste tua camisa, vibra, torce, mas abraça o teu amigo torcedor rival, beija teu amor adversário. Ou então vais ficar no zero a zero.


(Danilo Kuhn)


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